terça-feira, 30 de dezembro de 2008

MEMÓRIA - 1

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Reli hoje o Livro de José Cardoso Pires De Profundis Valsa Lenta, e mais uma vez me dei conta da importância que tem para o ser humano algo que o nosso cérebro guarda numa gaveta muito especial e que dá pelo nome de Memória .
Consultei Larousse e achei: Memória “Actividade biológica que permite reter as experiências anteriormente vividas…”
Acontece que a minha memória conserva bem nítidas algumas das experiencias que vivi, enquanto que de outras já mal lhes defino os contornos…
Significa que já se esvaneceu na tal gaveta algo que não queria perder, daí que esteja plenamente de acordo com as palavras de José Leon Machado quando em 1997, e a propósito do Livro de José Cardoso Pires, escreveu: “… sem memória esvai-se o presente que simultaneamente já é passado morto. A memória é indispensável para que o tempo não só possa ser medido como sentido...”
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Entrelinhas duma MEMÓRIA
Ao longo de mais de quarenta anos resisti à tentação de passar ao papel alguns dos momentos mais marcantes que vivi na Guerra Colonial em Angola.
Quis o destino que me fossem confiadas tarefas de retaguarda, e por isso as minhas memórias não são belicistas mas positivas.

O calendário marcava 20 de Novembro de 1965, a minha comissão de serviço em Angola já ia a meio quando fui enviado para Nóqui na fronteira com o Congo Brazzaville. O dia aproximava-se do fim quando a Corveta da Marinha de Guerra Portuguesa zarpou do porto de Luanda. Comigo iam, para além do sargento Gonçalves, dois bons companheiros: António Faria ( o pombal ) e Serafim Alves Minga ( o ruivo ). Destino: Santo António do Zaire. Com a chegada da noite veio o frio que em pleno Oceano Atlântico se fazia sentir com mais intensidade. Estávamos enregelados, confinados ao tombadilho do navio; a solução foi procurar os locais que ficavam por cima dos motores, logo mais quentes , e aí nos acomodar-mos para melhor resistir à baixa temperatura.
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Em Santo António do Zaire
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Chegados na manhã seguinte, fomos instalados na unidade militar aí estacionada e cinco dias depois rumamos a Nóqui , agora a bordo de uma Barcaça de reabastecimento que, impulsionada por um motor já velho e cansado, navegou durante doze horas contra a forte corrente do Rio Zaire, naquela que foi, posso dizer, a viagem da minha vida.
As margens do segundo maior rio de Africa, hoje chamado Rio Congo eram de puro encantamento. Como a subida se fazia contra a corrente, tínhamos à esquerda a República do Congo Brazzaville, e à direita a então Província de Angola. Em muitos trechos do percurso o rio apresentava-se atapetado por uma maravilhosa vegetação aquática, que por vezes “escondia” o canal por onde vagarosamente haveríamos de passar. O encantamento da viagem só era interrompido quando um ou outro jacaré incomodado com a nossa presença abandonava o seu posto de vigia e mergulhava nas acastanhadas águas.
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Nóqui vista do alto da montanha
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Finalmente a acostagem em Nóqui, a chegada da barcaça era o acontecimento da semana, e no cais aglomerava-se um pequeno grupo de soldados surpreendidos com a vinda de novos companheiros e ansiosos por receber o sempre precioso saco de correio que por certo surgiria no meio dos bens de primeira necessidade.
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António Faria, Gaspar de Jesus, Sargtº Gonçalves, Serafim Minga
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Entregues as guias de marcha na secretaria da Unidade, e com o sargento Gonçalves instalado na messe de sargentos logo fomos transportados até ao cimo daquela impressionante e majestosa montanha, fronteira à cidade congolesa de Matádi.

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Esta narrativa continua dentro de alguns dias, caso não esteja a abusar da vossa paciência.



























8 comentários:

Anónimo disse...

Gaspar,aqui em casa ainda temos o hábito da conversa em família,então continue que vamos gostar.
Beijoca.
Nilda.
http://meucantin5.blogspot.com/

nachocarreras disse...

Sólo dejarte un saludo
¡Feliz año!
Salud y suerte.

Anónimo disse...

BOM 2009!

Forte abraço, Gaspar!

Miguel Almeida disse...

Olá Gaspar,
Fico ansioso à espera da continuação.

Também eu guardo memórias positivas dos 12 meses e qualquer coisa que passei em Cabimba embora acompanhando o meu pai que na altura fazia também a sua comissão.

1969/70, numca mais lá voltei mas não esqueço o calor, a vegetação luxuriante, os animais e o ambiente "protegido certamente" que se vivia em comunidade. Lembro-me de uma viagem muito parecida e o seu relato trouxe-me de volta essas memórias. Continue...

Anónimo disse...

Além da arte fotográfica é bom descobrir-lhe o dom pela narrativa! Sempre a surpreender amigo Gaspar!... fico à espera do 2º episódio. BOAS ENTRADAS E FELIZ 2009!

Anónimo disse...

Amigo Gaspar

Obrigado pela visita e pelo comentário no meu blogue. Às vezes há transmissões de pensamento (rs).

Faz bem em nos recordar esses tempos idos que nos marcaram.

Eu fui para lá com 4 anos e vim para Coimbra aos 16.
Infelizmente só lá voltei em 75 para "fechar a porta".
Fui o último Oficial-Médico de Dia ao Hospital Militar de Luanda e ainda guardo a última bandeira portuguesa que lá esteve hasteada.
Regressei no último avião militar que saiu de Angola.

Mas gostaria de poder voltar.

Boas entradas em 2009
Abraço

:.tossan® disse...

Além de ótimo fotógrafo eis um grande narrador! Vou esperar sim, quero conhecer esta aventura que me faz lembrar o Pantanal do MTS. Tin..tin em 2009. Abraço bem forte.

Aufgeblassen disse...

what color is your dookie?

5ª TERTÚLIA A 02 DE JULHO

5ª TERTÚLIA A 02 DE JULHO
COM A ARTE NO OLHAR